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quarta-feira, 13 de agosto de 2008

A nova cara da empresa global

Fonte: Revista Exame online 07.08.2008
A indiana Indra Nooyi personifica a reação das grandes multinacionais à mudança do centro de poder mundial. Para ganhar espaço nos mercados que mais crescem no mundo, essas
companhias precisam entender a dinâmica de países emergentes, como Brasil e Índia.
Por Cristiane Mano, de Nova York

Uma porção de batatas fritas. Uma lata de refrigerante. Quantos produtos além desses identificam de maneira tão simples e imediata o estilo de vida americano que se espalhou pelo mundo ao longo do último século? Sob esse aspecto, a Pepsico, dona de marcas como Ruffles e Pepsi, representa uma espécie de quintessência dos hábitos do país. Assim como na esmagadora maioria de outras corporações gigantes baseadas nos Estados Unidos, o perfil dos executivos que estiveram à frente da companhia até pouco tempo atrás segue uma linhagem tão americana quanto seus produtos mais conhecidos. Homem, branco, nascido e criado no país. A descrição se encaixa em cada um dos quatro primeiros executivos que presidiram a Pepsico desde sua formação, em 1965, da fusão da fabricante de salgadinhos Frito Lay com a empresa de bebidas Pepsi-Cola. Aos 86 anos, Donald Kendall, o primeiro desses presidentes, ainda circula todos os dias pelos corredores do escritório da sede da Pepsico em Purchase, um vilarejo a cerca de 30 minutos do centro de Manhattan. Kendall, um dos idealizadores do negócio que deu origem à Pepsico, ocupa uma das maiores salas do 3o andar de um dos seis prédios que compõem o complexo da sede da companhia. É preciso caminhar um pouco mais pelo corredor para encontrar a ampla sala em que trabalha a única exceção nessa linhagem sucessória da Pepsico — a indiana Indra Nooyi. Em outubro de 2006, ela se tornou a primeira mulher e — mais importante — a primeira executiva nascida fora dos Estados Unidos a comandar a empresa, uma potência com vendas de 39 bilhões de dólares no ano passado, operações em 200 países e valor de mercado de mais de 100 bilhões de dólares.

Aos 52 anos, Indra é, de vários ângulos, uma exceção não apenas na casta de presidentes da Pepsico como também no universo empresarial americano. O motivo mais óbvio está em sua origem. Filha de um contador e de uma dona-de-casa, ela nasceu e cresceu em Chennai (antiga Madras), na Índia. Graduada em química, com especialização em administração pelo Indian Institute Management, mudou-se para os Estados Unidos em 1978 para cursar MBA em Yale. Indra hoje compõe o restrito time de 15 executivos à frente de uma das 100 maiores empresas americanas que não nasceram nos Estados Unidos. Entre eles estão o australiano Andrew Liveris, presidente da Dow Chemical, e o também indiano Vikram Pandit, presidente do Citigroup nomeado em dezembro de 2007. Carismática e informal, ela desenvolveu um estilo de liderança peculiar. Casada e mãe de duas adolescentes, costuma organizar jantares em sua casa para receber os executivos da empresa (com seus cônjuges). Nas festas da Pepsico assume o comando do karaokê e solta a voz — o repertório vai de músicas caribenhas a clássicos do rock. “Nunca imaginei chegar até aqui”, disse ela a EXAME, num inglês ainda marcado pelo sotaque indiano.

Indra não se destaca simplesmente por ser uma espécie de antípoda de seus antecessores — e da maior parte dos executivos de grandes empresas. Ela vem se tornando a própria personificação de um fenômeno novo: a transferência de poder econômico dos tradicionais centros mundiais para países emergentes. Há poucas semanas, Indra fez circular entre os executivos da Pepsico o livro The Post-American World (algo como “O mundo pós-americano”), de seu amigo e jornalista indiano Fareed Zakaria, colaborador da revista Newsweek. O livro discute, nas próprias palavras de Zakaria, “a ascensão do resto do mundo”. (O candidato democrata à presidência dos Estados Unidos Barack Obama foi fotografado em maio com uma cópia do livro.) A distribuição de The Post-American World não é uma provocação, mas um alerta: a inércia pode matar as empresas que não entenderem essa nova ordem mundial. “Indra está redefinindo o que uma empresa global deve ser”, diz o indiano Vijay Govindarajan, professor de negócios internacionais da Universidade de Tuck e diretor do centro de liderança global da universidade. Nos últimos dois anos, ela foi considerada pela revista americana Fortune a executiva mais poderosa do mundo. Foi também apontada como uma das 100 personalidades mais influentes da atualidade pela semanal Time (a executiva aparece na 78a posição, à frente de gente como Steve Jobs, fundador da Apple, e Jeff Immelt, presidente mundial da GE). Listas desse tipo não querem dizer muita coisa. Outras mulheres de negócios entraram e saíram delas — e a saída quase sempre tem a ver com tropeços memoráveis em suas trajetórias. O importante, no caso de Indra, é menos sua biografia até aqui e mais suas idéias para o futuro.

Indra Nooyi
Presidente mundial da Pepsico

Idade
52 anos
Origem
Chennai (antiga Madras), Índia
Formação acadêmica
Graduou-se em química e cursou especialização em administração na Índia. Em 1978, ingressou numa turma de MBA em Yale, nos Estados Unidos
Trajetória profissional
Passou pelo Boston Consulting Group, pela Motorola e pela ABB. Há 14 anos na Pepsico, era a principal executiva de finanças antes de se tornar presidente, no final de 2006

Um dos principais motivos pelos quais ela se tornou uma celebridade no mundo dos negócios é o sucesso com que vem conduzindo os planos de expansão global da Pepsico. Assim que assumiu o comando da empresa, Indra começou a redesenhar a maneira como as decisões estratégicas são tomadas — incluindo cada vez mais executivos ao redor do mundo (veja quadro acima). Ela também passou a incentivar a criação e aquisição de marcas locais e o intercâmbio de informações entre todas as suas operações globais. Com essas medidas, em apenas dois anos a Pepsico mudou a composição de seu faturamento — e a participação das subsidiárias nas vendas aumentou 10 pontos percentuais (veja quadro na pág. 23). Num momento em que empresas brasileiras começam a trilhar o caminho da globalização, olhar o que Indra vem fazendo na Pepsico pode ser didático. Para as companhias nacionais que pretendem ficar por aqui, seus movimentos servem de alerta. Cada vez mais multinacionais como a Pepsico se voltarão para o lado do mundo que cresce com mais velocidade — e isso, claramente, inclui o Brasil. Para as grandes corporações internacionais de bens de consumo, reagir às mudanças provocadas pelo avanço dos países emergentes não é propriamente uma opção. É uma necessidade. A atual fragilidade da economia americana torna a situação ainda mais incômoda para as corporações sediadas nos Estados Unidos. De líderes históricas, muitas dessas empresas passaram a alvo de aquisição de emergentes. O exemplo mais contundente do declínio da hegemonia americana é a recém-concluída compra da cervejaria Anheuser-Busch pela InBev, engendrada pelo trio de empresários brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.

O poder emergente

Algumas das principais mudanças que Indra Nooyi está fazendo...
Aposta em produtos locais
Reforçou a estratégia de criação de marcas locais e a troca de experiências entre os 200 países em que atua. Um exemplo disso é o refrigerante com menos gás H2OH!, criado por um brasileiro em 2006 e que agora está presente em 15 países — entre os quais Irlanda e Vietnã
Compras em emergentes
Em 2007, investiu 1,7 bilhão de dólares em aquisições, sobretudo em países emergentes, como da marca de salgadinhos Lucky, no Brasil, e da fabricante de sucos Lebedyansky, na Rússia. As vendas da Pepsico fora dos Estados Unidos cresceram 25% no ano passado — ante um aumento de cerca de 5% no mercado americano
Mais países ajudam a decidir
Ampliou de 10 para 29 o número de profi ssionais de seu comitê executivo. Entre os novos integrantes estão representantes de regiões como Ásia e América Latina. Eles agora discutem o rumo estratégico de toda a companhia. Em setembro, pela primeira vez na história da Pepsico, uma reunião do comitê acontecerá fora dos Estados Unidos, na Índia
...e como seu esforço de expansão global aumentou a participação dos negócios internacionais nos resultados financeiros da Pepsico
Faturamento
2005
32,5 bilhões de dólares
72% Estados Unidos
28% Subsidiárias
2007
39,5 bilhões de dólares

62%

Estados Unidos
38% Subsidiárias
Lucro operacional
2005
6,7 bilhões de dólares
76% Estados Unidos
24% Subsidiárias
2007
7,9 bilhões de dólares
74% Estados Unidos
26% Subsidiárias
Fonte: empresa

Devido ao perigo iminente, outras grandes multinacionais, além da Pepsico, começam a se reinventar, tentando entender para onde vai o mercado. É o caso da anglo-holandesa Unilever, com vendas de 59 bilhões de dólares em 2007. Nenhum dos três favoritos para suceder o atual presidente mundial da companhia, o francês Patrick Cescau, é europeu. O mais cotado é o indiano Manvinder Singh Banga, atual diretor da unidade de produtos de limpeza nos Estados Unidos. Os outros candidatos são o indiano Harish Manwani, responsável pelas operações da Unilever na Índia, e Doug Baillie, presidente para a Europa Ocidental. Nascido no Zimbábue, Baillie foi o presidente da operação indiana de 2006 até o início deste ano. A consultoria de contratação de altos executivos Egon Zehnder deverá definir o nome do sucessor no ano que vem. Todos os candidatos apontados recentemente numa reportagem do Wall Street Journal têm em comum algo valioso para os resultados financeiros da Unilever: a experiência em mercados emergentes. Em países como Índia e China, os gastos com bens de consumo estão crescendo rapidamente e neles a concorrente Procter & Gamble ainda não é tão forte como nos Estados Unidos. Como que simbolizando o fim de uma era, desde o início deste ano não há nenhum inglês ou holandês no comitê executivo da Unilever.

Eles também estão olhando para fora

Como algumas das mais tradicionais empresas americanas estão adaptando sua própria organização ao mercado global
Jeff Immelt
Presidente mundial da General Electric
A companhia centenária vive um momento histórico. Pela primeira vez, mais da metade das vendas de 172 bilhões de dólares em 2007 veio de fora de seu país de origem. Na última década, a GE abriu seus primeiros três centros de pesquisa fora dos Estados Unidos — na Índia, na China e na Alemanha. Recentemente, iniciou estudos para replicar o reverenciado centro de treinamento de Crotonville em países como a China

A busca por executivos com experiência internacional, aliás, está se tornando obsessão. Em 2003, 26% dos presidentes das 500 maiores empresas americanas tinham experiência internacional. Hoje, 34% já passaram por algum país além de seu próprio de origem. “Os critérios para a escolha de lideranças mudaram dramaticamente na última década”, diz Elisabeth Marx, sócia do escritório londrino da empresa de contratação de altos executivos Heidrick & Struggles. “Hoje não há substituto para a experiência global.” Segundo pesquisa da consultoria McKinsey no início deste ano, há uma correlação direta entre melhores resultados financeiros e o incentivo ao intercâmbio global de lideranças. A pesquisa considerou 22 das mais conhecidas multinacionais do mundo e entrevistou 450 executivos, entre presidentes e diretores de diversas áreas. O resultado indica que as empresas mais hábeis na gestão global de seus talentos, e que adotam medidas como incentivar os profissionais a ter experiências em diversos países, estão em geral no terço da amostra com melhor resultado financeiro (veja quadro abaixo).

Sam Palmisano
Presidente mundial da IBM
Ao longo dos últimos cinco anos, a companhia modifi cou sua estrutura de negócios pelo mundo. Hoje, a IBM possui três centros de compras para todas as suas operações mundiais — uma delas na China. A empresa também criou quatro grandes centros de prestação mundial de serviços em países como Índia e Brasil. Em 2007, 63% das vendas de 100 bilhões de dólares da IBM vieram de fora dos Estados Unidos

A preocupação em aumentar a diversidade dos profissionais, em alguns casos, se estende aos conselhos de administração. A centenária ADM, por exemplo, contratou os primeiros conselheiros não-americanos há cerca de dois anos. Um deles é o brasileiro Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano Papel e Celulose. A lógica é incorporar visões de mundo diferentes ao definir o próprio futuro nos vários mercados em que a companhia faz negócios. As reuniões do conselho historicamente sempre ocorreram nos Estados Unidos. Em fevereiro de 2007, essa tradição se quebrou. A primeira das cerca de cinco reuniões de conselho que a empresa promove todos os anos foi em São Paulo — o grupo visitou ainda os estados de Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul. Metade dos conselheiros nunca havia estado no país, embora o Brasil seja hoje o principal alvo de novos negócios da ADM. Outras empresas, como a também centenária GE, buscam conhecimento em países emergentes em vez de apenas enviar a experiência acumulada da matriz. Na última década, a companhia abriu seus primeiros três centros de pesquisa fora dos Estados Unidos — na Índia, na China e na Alemanha. Atualmente, existem estudos para replicar o reverenciado centro de treinamento em Crotonville em países como a China. A GE vive hoje um momento histórico. Pela primeira vez, mais da metade das vendas de 172 bilhões de dólares em 2007 veio de fora dos Estados Unidos.

Patricia Woertz
Presidente mundial da ADM

A ADM, líder na produção de etanol nos Estados Unidos, contratou pela primeira vez, há dois anos, conselheiros estrangeiros — como o brasileiro Antonio Maciel Neto. A gigante também mudou a rotina de encontros do conselho, tradicionalmente realizados em seu país de origem. Em fevereiro de 2007, a companhia decidiu reunir os conselheiros no Brasil — um de seus principais alvos para novos negócios

Uma das definições mais eloqüentes do que representa a nova empresa global é de Sam Palmisano, presidente mundial da IBM. Há pouco mais de um ano, ele decretou o fim das multinacionais e o início de um novo padrão de empresas globais num artigo publicado no influente jornal inglês Financial Times. Segundo Palmisano, as primeiras multinacionais nasceram no século 19, quando as empresas começaram a montar escritórios de venda em outros países. Mais tarde, essas companhias criaram uma espécie de miniatura de suas matrizes em cada país. Para Palmisano, o momento atual exige a realocação das etapas de negócios onde elas são realizadas de modo mais eficiente, sem considerar fronteiras geográficas. Hoje, a IBM possui três centros de compras para todas as suas operações mundiais — e não mais uma por país. A empresa também criou quatro grandes centros de prestação mundial de serviços em países como Índia e Brasil. Em junho de 2006, numa atitude simbólica, Palmisano realizou sua primeira reunião anual com investidores fora dos Estados Unidos, no Palácio Bangalore, uma casa de eventos que pretende ser uma réplica do Castelo de Windsor, numa região conhecida como o Vale do Silício indiano. Seu objetivo era impressionar cerca de 50 investidores e analistas de Wall Street. A reunião teve direito até à recepção de uma estrela de Bollywood vestida num sari vermelho. “A companhia globalmente integrada é melhor e mais rentável — e pode trazer benefícios econômicos tanto para os países desenvolvidos como para os emergentes”, escreveu Palmisano.

Líderes cada vez mais globais
O percentual de presidentes de empresas das 500 maiores companhias americanas com experiência internacional aumentou nos últimos cinco anos
26% em 2003
34% em 2008
Levantamento recente realizado pela consultoria McKinsey com 450 executivos de grandes empresas americanas mostra que as mais bem-sucedidas possuem uma estratégia global mais consistente
Os principais executivos encorajam as pessoas a ter experiência em vários negócios e países da organização
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os melhores resultados financeiros 79%
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os piores resultados financeiros 57%
Experiência internacional é pré-requisito para promoção a níveis mais altos na organização
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os melhores resultados financeiros 45%
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os piores resultados financeiros 25%
Os executivos são incentivados a “ceder” seus melhores talentos a outras divisões de negócios em outros países
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os melhores resultados financeiros 45%
Empresas que seguem a prática no terço da amostra que apresentou os piores resultados financeiros 25%
Fontes: Spencer Stuart e McKinsey

No caso de Indra, acelerar a expansão global da Pepsico é parte de um compromisso assumido em meados dos anos 90. Na época, ela havia sido contratada como diretora da área de fusões e aquisições pelo então presidente da companhia, Roger Enrico, após uma carreira em empresas como Motorola, ABB e a consultoria Boston Consulting Group. Enrico pediu a Indra que elaborasse a estratégia do que deveria ser a corporação do século 21. Naquela fase, a Pepsico perdia de maneira retumbante a corrida global para a Coca-Cola. Enquanto cerca de 30% das vendas da Pepsi vinham de outros países, mais de 70% das vendas da concorrente vinham de fora dos Estados Unidos. Em razão da crescente rejeição a refrigerantes e frituras no mundo todo, a primeira decisão de Indra foi mudar o portfólio da companhia. A executiva vendeu a divisão de restaurantes, com marcas como Pizza Hut, Taco Bell e KFC. Na seqüência, comprou por 14 bilhões de dólares a Quaker (dona das marcas Toddy e Gatorade) e por 3,3 bilhões a fabricante de sucos Tropicana. “Fiquei dias sem ir para casa. Tomava banho na academia da empresa e dormia no escritório”, diz ela, confessando seu lado workaholic.

Recentemente, a Pepsico passou a adquirir empresas fora dos Estados Unidos. Só no ano passado, investiu 1,7 bilhão de dólares em aquisições. Boa parte desse volume foi dedicada a mercados emergentes, como a compra da maior fabricante de sucos da Rússia, a Lebedyansky, e a fabricante de salgadinhos brasileira Lucky, dona das marcas Torcida e Fofura. “Já estamos com pelo menos mais quatro negócios sendo analisados no país e um deles deve ser fechado ainda neste ano”, diz o paulista Otto von Sothen, presidente da divisão de alimentos da Pepsico no Brasil. “A Pepsico tem se mostrado uma eficiente compradora de negócios ao redor do mundo, o que está transformando seu negócio global e fazendo com que suas vendas aumentem com consistência”, diz o analista especializado em bens de consumo Marc Greenberg, da filial do Deutsche Bank em Nova York.

Dentro da definição da corporação do século 21 criada por Indra, existe cada vez mais autonomia tanto para comprar como para lançar produtos localmente. Seu objetivo é fazer com que essas iniciativas locais sejam partilhadas com o resto do mundo — algo que Indra batizou de autonomia conectada. Agora não apenas as subsidiárias se curvam diante da matriz todo-poderosa, mas o contrário também começa a acontecer. Na nova lógica da Pepsico, as experiências de uma fabricante como a brasileira Lucky pode se revelar atraente também para a própria matriz — ou pelo menos seu modelo de negócios pode ser replicado em outras partes do mundo. No começo deste ano, um grupo de americanos esteve no Brasil para conhecer a peculiar estrutura comercial e logística da Lucky — na qual não existe um único vendedor. Em vez de uma força de vendas, a empresa possui apenas um sistema de recebimento de pedidos por e-mail ou telefone, localizado em sua sede, em São Paulo. Sem os altos investimentos para colocar uma equipe comercial na rua, a Lucky consegue manter preços baixos para os clientes — o que garante a fidelidade. “Estamos estudando profundamente esse modelo para avaliar a possibilidade de replicá-lo em outros países”, diz o americano John Compton, diretor da divisão de alimentos para as Américas.

A nova ordem da globalização da Pepsico já fez com que uma marca lançada no Brasil no final de 2006 — a H2OH! — hoje esteja à venda em 15 países, como Irlanda e Vietnã. O carioca Carlos Ricardo, de 45 anos, coordenou o lançamento do produto desde sua concepção enquanto estava à frente da diretoria de marketing da empresa na matriz, em Nova York. Hoje, a marca lidera uma nova categoria de produtos inaugurada por ela mesma — a de bebidas doces com menos gás. A Coca-Cola logo lançou a Aquarius para fazer frente ao lançamento da concorrente. “Viramos referência para outros lugares do mundo”, diz Vasco Luce, presidente da divisão de bebidas da Pepsico no Brasil. Hoje, como vice-presidente de marketing da área de alimentos da Pepsico no Brasil, Carlos Ricardo criou um salgadinho à base de legumes brasileiros, como inhame e mandioca, com a marca Raízes do Brasil. É uma tentativa de fazer crescer as vendas no país com marcas locais, já que a global Lays, de batata frita, não decolou por aqui. (Por causa de um incêndio na fábrica de Curitiba em dezembro, a produção da linha Raízes do Brasil foi interrompida e só deve ser retomada no final deste ano.)

A nova empresa global de Indra está longe de ser uma obra acabada. Neste ano, para ampliar o fluxo de informação e conhecimento das subsidiárias para a matriz, ela aumentou o número de profissionais de seu comitê executivo de dez para 29. “A única razão para isso é elevar a qualidade da discussão”, diz ela. Um dos novos integrantes é o suíço Olivier Weber, diretor da Pepsico para a América Latina e ex-presidente da operação brasileira. O grupo já se encontrou duas vezes neste ano em Nova York. O terceiro encontro, agendado para setembro, será pela primeira vez fora dos Estados Unidos. O local escolhido foi Nova Délhi, na Índia. “Além da reunião, teremos uma agenda de visitas a varejistas e fábricas locais”, diz Weber. Ao escolher Nova Délhi, Indra quis mandar uma mensagem enfática a seu pessoal: a fórmula que deu certo no passado não funcionará mais daqui para a frente. “Ainda hoje, quando boa parte dos executivos que fizeram carreira em países estáveis fala em mercados globais, está se referindo a Paris, Genebra e Londres”, diz ela. “É preciso mudar rapidamente essa visão para realmente construir uma empresa global.”

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